quarta-feira, 6 de junho de 2018

DIDAQUÊ: Introdução - O Manual Mais Antigo da Igreja Cristã

Qual a razão pela qual um pequeno e muito antigo documento anônimo, de pouco mais de dez páginas tem chamado tanta atenção. A resposta é que a Didaquê preenche uma lacuna documental-histórico do período pós-apostólica (após a destruição de Jerusalém 70 d.C.) e meados do segundo século, um dos períodos mais obscuros e desconhecidos da história da Igreja. A descoberta deste pequeno documento abriu muitas possibilidades para se encontrar respostas para algumas das questões históricas desse período eclesiástico da Igreja.A Didaquê faz parte permanente em cada coleção dos Padres Apostólicos, em cada pesquisa sobre o Canon do Novo Testamento, o conteúdo do ensino, do culto primitivo e da disciplina nas comunidades cristãs espalhadas rapidamente por todo o Império Romano, bem como contribui na elaboração de comentários dos evangelhos.Os estudiosos, desde sua descoberta, têm se debruçado exaustivamente sobre a discussão sobre a sua autoria, quando e onde de sua composição, a sua relação com documentos cognatos, como por exemplo a Epístola de Barnabé, o Pastor Hermas, e o cinturão literário que se forma ao redor da literatura canônica.Desde sua descoberta e posteriores edições a Didaquê têm sido usada por praticamente todas as denominações e seitas cristãs evangélicas para apoiar essa ou aquela doutrina peculiar de cada uma delas, entretanto, o valor primário dela está em seu aspecto histórico e por este prisma o documento deve ser estudado.A Didaquê está classificada nos mesmo nível da literatura dos chamados Pais Apostólicos, contribuindo para a consolidação da Igreja Cristã. Também atesta em grau, gênero e numero a superioridade inequívoca da literatura neotestamentária em relação a todas as demais literaturas eclesiásticas posteriormente produzidas. Diante do Sermão da Montanha, ou do Evangelho Segundo João, ou a Epístola aos Gálatas, ou ainda da Epístola de Tiago do qual mais se assemelha, a relevância da Didaquê assume seu valor diminuto.Em nenhum momento a Didaquê reivindica uma autoridade apostólica; em seu silêncio reivindicatório assume ser um extrato, produzido por seu autor desconhecido, do que ele havia aprendido e agora utiliza para instruir a outros sobre o que ele cria ser fielmente o ensino dos apóstolos. É um documento pós apostólico, mas não pseudo-apostólico, podendo desta forma assumir seu lugar entre os documentos produzidos originalmente pelos chamados Pais Apostólicos como Clemente de Roma, Policarpo, Inácio, Hermas. Na verdade, a Didaquê preenche a lacuna entre o período apostólico e dos patrísticos, assim como a literatura apócrifa do Antigo Testamento ocupa o espaço do chamado período interbíblico de Malaquias a João Batista.

O Título
O termo Didaquê (Διδαχή) é derivado de Atos 2.42 onde se registra que os primeiros cristãos “perseveravam no ensino (doutrina) dos apóstolos, na comunhão, no partir do pão e nas orações”. É possível compreendê-la também como uma espécie de “Credo dos Apóstolos”, em seu conteúdo e não em sua forma.Em nenhum momento o autor tem pretensões apostólicas, mas apenas de alguém que registra seus ensinos. Não reivindica lugar entre os escritos inspirados, diferenciando-se de vasta literatura similar, onde o nome de um apóstolo é introduzido com o propósito de torna-la canônica. Todavia, não se encontra na Didaquê qualquer fraude literária ou ensinos espúrios.O manuscrito da Didaquê possui dois títulos: Um mais curto: "Ensino dos Doze Apóstolos" e um mais longo: "O ensino do Senhor para as Nações [gentios] através dos Doze Apóstolos." Neste título mais longo temos a identificação da fonte original “ensino do Senhor [Jesus]” e os leitores primários “as nações”, ou seja, os cristãos não judeus que deveriam ser preparados para receberem o batismo para se constituírem membros das comunidades cristãs, espalhadas pelas mais diversificadas nações incluídas nos domínios do Império Romano. Nessa especificação é possível identificar um diferencial entre a inclusão de gentios e judeus na comunidade cristã, em relação ao batismo, mas não em relação as demais atribuições eclesiásticas, como poderemos perceber ao abordarmos seu conteúdo.

Conteúdo e Propósito
A Didaquê se constitui em Manual Eclesiástico abarcando a síntese do ensino Apostólico, diretrizes em relação ao culto e à disciplina, como compreendida pelo autor e certamente exercitada na comunidade da qual ele participava. É claramente destinada aos professores e às lideranças eclesiásticas responsáveis pelas comunidades cristãs. Quanto a esses objetivos serve plenamente: é ao mesmo tempo didático e prático, e apesar de ser sucinto é também abrangente, e está convenientemente organizado em quatro partes.Por se constituir no manual mais antigo desse tipo, a Didaquê com toda certeza foi ao longo dos anos sofrendo diversas modificações, e, evoluindo para manuais mais completos. Ela está dividida em quatro partes que abrangem a totalidade da vida cristã:I. A parte doutrinal e catequética, estabelecendo o dever de todo o cristão. Caps. I-VIII. A parte litúrgica e devocional, dando indicações para o culto cristão. Caps. VII-X e XIV.III. A parte eclesiástica e disciplinar, exercida pela liderança constituída da Igreja. Caps. XI-XIII e XV.IV. A parte escatológica ou esperança do cristão Caps. XVI.



Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Reflexão Bíblica
http://reflexaoipg.blogspot.com.br/
Texto retirado de: http://historiologiaprotestante.blogspot.com/2016/09/didaque-introducao-o-manual-mais-antigo.html acessso em: 07/06/18

O Credo de Atanásio*

ORIGEM
O Credo de Atanásio, subscrito pelos três principais ramos da Igreja Cristã, é geralmente atribuído a Atanásio, Bispo de Alexandria (século IV), mas estudiosos do assunto conferem a ele data posterior (século V).  Sua forma final teria sido alcançada apenas no século VIII. O texto grego mais antigo deste credo provém de um sermão de Cesário, no início do século VI.
O credo de Atanasio, com quarenta artigos, é um tanto longo para um credo, mas é considerado “um majestoso e único monumento da fé imutável de toda a igreja quanto aos grandes mistérios da divindade, da Trindade de pessoas em um só Deus e da dualidade de naturezas de um único Cristo.” [1]
TEXTO
1. Todo aquele que quiser ser salvo, é necessário acima de tudo, que sustente a fé universal. [2] 
2. A qual, a menos que cada um preserve perfeita e inviolável, certamente perecerá para sempre. 
3. Mas a fé universal é esta, que adoremos um único Deus em Trindade, e a Trindade em unidade.
4. Não confundindo as pessoas, nem dividindo a substância. 
5. Porque a pessoa do Pai é uma, a do Filho é outra, e a do Espírito Santo outra. 
6. Mas no Pai, no Filho e no Espírito Santo há uma mesma divindade, igual em glória e co-eterna majestade. 
7. O que o Pai é, o mesmo é o Filho, e o Espírito Santo. 
8. O Pai é não criado, o Filho é não criado, o Espírito Santo é não criado
9. O Pai é ilimitado, o Filho é ilimitado, o Espírito Santo é ilimitado. 
10. O Pai é eterno, o Filho é eterno, o Espírito Santo é eterno. 
11. Contudo, não há três eternos, mas um eterno. 
12. Portanto não há três (seres) não criados, nem três ilimitados, mas um não criado e um ilimitado. 
13. Do mesmo modo, o Pai é onipotente, o Filho é onipotente, o Espírito Santo é onipotente. 
14. Contudo, não há três onipotentes, mas um só onipotente. 15. Assim, o Pai é Deus, o Filho é Deus, o Espírito Santo é Deus. 
16. Contudo, não há três Deuses, mas um só Deus. 
17. Portanto o Pai é Senhor, o Filho é Senhor, e o Espírito Santo é Senhor.
18. Contudo, não há três Senhores, mas um só Senhor. 
19. Porque, assim como compelidos pela verdade cristã a confessar cada pessoa separadamente como Deus e Senhor; assim também somos proibidos pela religião universal de dizer que há três Deuses ou Senhores. 
20. O Pai não foi feito de ninguém, nem criado, nem gerado. 
21. O Filho procede do Pai somente, nem feito, nem criado, mas gerado. 
22. O Espírito Santo procede do Pai e do Filho, não feito, nem criado, nem gerado, mas procedente. 
23. Portanto, há um só Pai, não três Pais, um Filho, não três Filhos, um Espírito Santo, não três Espíritos Santos. 
24. E nessa Trindade nenhum é primeiro ou último, nenhum é maior ou menor. 
25. Mas todas as três pessoas co-eternas são co-iguais entre si; de modo que em tudo o que foi dito acima, tanto a unidade em trindade, como a trindade em unidade deve ser cultuada. 
26. Logo, todo aquele que quiser ser salvo deve pensar desse modo com relação à Trindade. 
27. Mas também é necessário para a salvação eterna, que se creia fielmente na encarnação do nosso Senhor Jesus Cristo. 
28. É, portanto, fé verdadeira, que creiamos e confessemos que nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo é tanto Deus como homem. 
29. Ele é Deus eternamente gerado da substância do Pai; homem nascido no tempo da substância da sua mãe. 
30. Perfeito Deus, perfeito homem, subsistindo de uma alma racional e carne humana. 
31. Igual ao Pai com relação à sua divindade, menor do que o Pai com relação à sua humanidade. 
32. O qual, embora seja Deus e homem, não é dois mas um só Cristo. 
33. Mas um, não pela conversão da sua divindade em carne, mas por sua divindade haver assumido sua humanidade. 
34. Um, não, de modo algum, pela confusão de substância, mas pela unidade de pessoa. 
35. Pois assim como uma alma racional e carne constituem um só homem, assim Deus e homem constituem um só Cristo. 
36. O qual sofreu por nossa salvação, desceu ao Hades, ressuscitou dos mortos ao terceiro dia. 
37. Ascendeu ao céu, sentou à direita de Deus Pai onipotente, de onde virá para julgar os vivos e os mortos. 
38. Em cuja vinda, todo homem ressuscitará com seus corpos, e prestarão conta de sua obras. 
39. E aqueles que houverem feito o bem irão para a vida eterna; aqueles que houverem feito o mal, para o fogo eterno. 
40. Esta é a fé Universal, a qual a não ser que um homem creia firmemente nela, não pode ser salvo. [3]

NOTAS
Extraído de Paulo Anglada, Sola Scriptura : A Doutrina Reformada das Escrituras (São Paulo: Os Puritanos, 1998), 180-82.
[1] A. A. Hodge, The Confession of Faith ( Edinburgh & Pennsylvania: The Banner of Truth Trust, 1992 ), 7.
[2] O termo universal traduz a palavra católica , a qual também poderia ser traduzida por geral .
[3] Traduzido a partir do inglês de A. A. Hodge, Outlines of Theology ( Edinburgh, & Pennsylvania: The Banner of Truth Trust, 1991), 117-118.

Texto retirado de: http://www.monergismo.com/textos/credos/credoatanasio.htm acesso em: 06/06/18